
Enquanto o próprio Estado tenta calar seu povo e oferecer migalhas, sempre haverá estudantes gritando em resposta do outro lado. A massa popular coreana aprendeu a ser resistência desde o final do século XIX, quando a consciência de que ali naquele território o povo era pelo povo e não haveria força maior que os derrotaria. O povo coreano foi resistência durante a colonização japonesa, entrada dos Estados Unidos e China no país, sobreviveram a Guerra e Divisão Nacional, e não estremeceram diante a ditadura entre os anos 1960 e 1980.
Com o calamitoso século XX marcado por mais de 30 anos de colonização japonesa, palco de conflitos ideológicos e três anos de Guerra que determinaram a divisão nacional, a repressão continuou sendo o contexto de desenvolvimento para a Coreia do Sul. Em busca de uma estabilidade no modelo capitalista liderado pelo Estado, o caminho seguido era a da repressão da ditadura instaurada por Park Chung Hee entre 1961 e 1979.
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Com seu assassinado em 1979, um – muito – breve período de democracia vigente na Coreia do Sul possibilitou que trabalhadores exigissem melhores condições de trabalho, tal qual estudantes e intelectuais clamavam por melhorias e liberdade acadêmica como reforma social. Os protestos dos estudantes continuaram até a primavera de 1980. Ano em que o general Chun Doo Hwan quebrou o ideal de politicas democráticas e deu um golpe militar, tomando poder.
Se enquanto o regime de Park, os movimentos de democratização haviam sido abolidos, no final dos anos 1979 ressurgiam com velocidade por todo país e das mais diversas reinvindicações. No inicio de 1980 sindicatos estudantis foram organizados para liderarem manifestações nacionais por reformas sociais, democratização e respeito aos direitos humanos, além de luta por direitos trabalhistas como salário mínimo e liberdade de expressão nos meios de comunicação em massa.
Porém em maio de 1980, a cidade de Gwangju, na província de Jeolla (ao sul), eclodiu em uma revolta popular contra o novo líder militar, General Chun Doo Hwan. O novo ditador reagiu violentamente e matou centenas de cidadãos de Gwangju. Este evento é conhecido como o Massacre de Gwanju. Mas os protestos não paravam apesar do aviso sangrento do novo general.
Foi em maio de 1980 que estudantes se reuniram na Universidade de Chonnam, a fim de impedir seu fechamento. Durante a manhã cerca de 200 estudantes entraram em conflito com as forças militares que agiam sob ordem do novo presidente ditador. Para o período da tarde o número aumento para mais de 2000.
À medida que o conflito crescia, o exercito passou a atirar nos cidadãos, nos dias 20 e 21 de maio, motoristas de taxi e ônibus se juntaram aos estudantes contra as forças armadas. Mas na tarde de 21 de maio, o ápice da manifestação, o exército literalmente massacrou a multidão que protestava em Chonnam. Em resposta, civis manifestantes invadiram a delegacia. Quase ao anoitecer, tiroteios sangrentos entre as milícias civis e o exército irromperam na Praça Provincial.
Os conflitos continuaram por dias e se alastravam por outras cidades. A Coreia do Sul estava tomada por manifestações de estudantes em conjunto de reivindicações trabalhistas e sociais contra as politicas tomadas por anos de repressão devidamente exercendo o poder com o único objetivo de crescer economicamente no padrão capitalista. Não foi dado um número exato de morte dos civis nos dias de protesto e massacres, mas cerca de 130 civis e 22 soldados foram mortos. Inclusive existe uma discussão alegando que pelo fato de que o numero de civis mortos em três dias serem relativamente baixo, o evento não deveria ser considerado um massacre.
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A Revolta de Gwanju impactou profundamente a história politica da Coreia do Sul, não apenas por consolidar a moral de resistência que a massa popular da Coreia se envolvia desde final do século XIX, mas também estremeceu ainda mais o governo de Chun Doo, que enfrentava crises de um governo fraco desde o inicio do mandato. Autorizar o exército massacrar publicamente a própria população prejudicou ainda mais sua legitimidade. Era uma catástrofe, sem dúvidas, pois os dias de revoltas em Gwanju e cidades próximas foram referencia para dezenas de outros movimentos de resistência posteriores durante a década de 1980. Esses movimentos eventualmente levaram a democracia à Coreia do Sul, por isso a Revolta de Gwangju é conhecida como um dos símbolos de luta sul coreano contra os regimes autoritários e pela democracia da nação.
O ativismo politico de estudantes na Coreia vem desde os movimentos de libertação em 1919, 1926 (a primeira em Gwangju) e 1929. Dezenas de protestos e manifestações liderados por estudantes marcam a história moderna da Coreia. E ainda em 1960 com a Revolução Estudantil de Abril. Estudantes coreanos desempenham por si, um dos principais papeis de liderança pró-democrática seguindo uma linha de discursos da moral e cultura coreana, já que historicamente os intelectuais eram considerados a “consciência da sociedade” ou “guerreiros contra a escuridão”.
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Qual grande erro é não ouvir suas manifestações (a dos estudantes) e pior ainda: o esculhambo, a agressão determinada a por um fim justamente a esses estudantes (dita às cores iluminadas da Coreia), defensoras da nação e democracia e autores de opinião pública. Estados sempre caem nessas armadilhas. Os estudantes continuam em pé, marchando.
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Que artigo bom!
Em um momento no qual o desempenho dos estudantes da Coreia do Sul está ironicamente sendo usado como forma de comparar e legitimar o desmonte da Educação no Brasil, como se eles apenas estudem silenciosamente sem se manifestar politicamente, eis que surge esse artigo como forma de demonstrar o quão importante historicamente é o movimento estudantil!
É o Koreapost se mostrando cada vez mais atual e inteligente. Maravilhoso!
Ainda não vasculhei o site, e não querendo abusar, gostaria muito de ler algo sobre a relação entre o último escândalo da indústria K-pop e o sexismo existente na Coreia do Sul. Essas análises sociais relacionadas à história e cultura são mara!!!!
Saranghae!
Ah! Li agora o artigo sobre o escândalo e a masculinidade tóxica! ❤👏🏾👏🏾👏🏾