Um terremoto de magnitude entre 4,2 e 5,1 ocorreu na manhã de hoje na Coreia do Norte, por volta das 10:00 no horário local. De acordo com o Instituto Geológico dos Estados Unidos (USGS), o tremor foi detectado cerca de 50 km de Punggye-ri, próximo ao local utilizado para os testes nucleares de 2006, 2009 e 2013. As reações iniciais, incluindo das autoridades sul-coreanas, sugerem que o incidente foi devido a uma explosão de origem humana, dando indícios de que a Coreia do Norte pode ter realizado um novo teste nuclear.

A mídia estatal norte-coreana declarou que foi realizado com sucesso às 10:00 do dia 06 de janeiro de 2016, o primeiro teste da bomba de hidrogênio do país, com base na determinação estratégica do Partido dos Trabalhadores da Coreia – haja vista o regime norte-coreano seguir a política de Byungjin, ou seja, de desenvolvimento econômico e nuclear, a qual vem assumindo o papel de principal eixo definidor das políticas norte-coreanas. Mas, o tamanho da explosão foi grande o suficiente para ter sido de um teste de bomba de hidrogênio?
É difícil verificar as alegações da Coreia do Norte. Todavia, caso a reclamação do teste seja verdadeira, tal evento indicará avanços significativos na busca de Pyongyang por armas nucleares e aumentará drasticamente o desafio de trazer, novamente, a Coreia do Norte para a Six Party Talks, fórum multilateral entre EUA, China, Rússia, Japão, Coreia do Sul e Coreia do Norte e que objetiva a desnuclearização da península coreana. O fórum – inativo desde 2009 devido à rejeição da Coreia do Norte em participar – vem tentando ser restabelecido mediante conversações exploratórias que acontecem desde 2014.
No mês passado, Kim Jong-un anunciou que a Coreia do Norte tinha uma bomba de hidrogênio – de tecnologia mais avançada para produzir uma explosão mais poderosa do que uma bomba atômica – e poderia lançá-la, caso fosse necessário, para defender a soberania do país e a dignidade do povo norte-coreano – embora alguns países tivessem expressado ceticismo.
Sabemos que a Coreia do Norte já violou as resoluções 1718 (2006), 1874 (2009), 2087 (2013) e 2094 (2013) do Conselho de Segurança das Nações Unidas, as quais proíbem ainda os seus testes nucleares, e suas ações desafiam o Tratado de Não-Proliferação Nuclear, do qual se retirou em 2003. O desenvolvimento do programa nuclear da Coreia do Norte continua ameaçando a paz e a segurança não só do leste asiático, mas de toda a comunidade internacional.
A seguir listamos o posicionamento de alguns atores diante de tal evento e a velocidade com a qual a notícia [1] “explodiu” no cenário internacional, como é do gosto de Kim Jong-un:
- A presidente sul-coreana Park Geun-hye chamou o teste de uma “grave provocação”, durante uma reunião de emergência do Conselho de Segurança Nacional do país. “O teste é não só uma grave provocação à nossa segurança nacional, mas também uma ameaça ao nosso futuro e um forte desafio à paz e à estabilidade internacional”, afirmou Park, pedindo fortes sanções contra Pyongyang. Inclusive, Seul está disposto a tomar as medidas necessárias, incluindo sanções adicionais do Conselho de Segurança da ONU contra a Coreia do Norte.
- O primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, declarou que o teste viola as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, além de ser uma ameaça grave à segurança do país à qual não tolerará e buscará coordenar esforços entre os membros da ONU para combater as ações da Coreia do Norte.
- A China, mediante a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Hua Chunying, reiterou a sua posição de desnuclearização da península coreana e exortou a Coreia do Norte a honrar o seu compromisso de desnuclearização e cessar qualquer ação que possa deteriorar a situação.
- O ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, Philip Hammond, emitiu uma declaração acusando a Coreia do Norte de uma “grave violação” da resolução da ONU. A Austrália já declarou que condena nos termos mais fortes possíveis o comportamento provocativo e perigoso do regime norte-coreano. Já a Casa Branca disse que ainda não pôde confirmar o teste, mas reiterou que os EUA “não vão aceitar a Coreia do Norte como um Estado nuclear”.
- Phil Robertson, vice-diretor da Human Rights Watch Ásia, afirmou que “o único presente de aniversário que Kim Jong-un deve obter da comunidade internacional é uma viagem só de ida para o Tribunal Penal Internacional em Haia, onde ele deve ser levado a julgamento por crimes contra a humanidade”, aludindo à pressão internacional que será feita para levar o líder norte-coreano ao TPI.
- A Agência Internacional de Energia Atômica, mediante comunicado do diretor-geral Yukiya Amano, declarou que, se confirmado, o teste configura uma clara violação das resoluções da ONU e que a Agência está pronta para retomar a verificação nuclear na Coreia do Norte.
Em agosto do ano passado, tivemos outros episódios de ameaça norte-coreana e promessa de novos testes nucleares. Primeiro, um impasse entre o Norte e o Sul devido à explosão de duas minas durante uma patrulha de rotina na Zona Desmilitarizada que resultou no ferimento grave de dois soldados sul-coreanos. Após intensas negociações, as duas Coreias chegaram a um acordo para aliviar as tensões militares desencadeadas pela explosão. Apesar de o lado Norte ter suspendido o alerta de quase estado de guerra e lamentado a explosão ocorrida na DMZ e o Sul ter interrompido as transmissões de propaganda anti-Pyongyang através de alto-falantes e guerra psicológica, não houve grandes avanços nas relações intercoreanas. Fato que, naturalmente, remonta à manutenção do uso de ameaça de estado de guerra como ferramenta de notoriedade e atenção internacional voltada para o regime de Kim Jong-un e à pergunta: qual é a dimensão do poder da propaganda?
Em seguida, na esteira do exercício militar anual Ulchi Freedom Guardian, entre EUA e Coreia do Sul, a fim de testar os sistemas de defesa e o grau de prontidão no caso de uma invasão norte-coreana ao Sul, Pyongyang ameaçou retaliar os EUA, caso o exercício militar acontecesse. A aliança ROK-US seguiu com o exercício. Surgiu a especulação de um futuro lançamento de míssil de longo alcance norte-coreano, com previsão para acontecer durante a comemoração do 70º aniversário da fundação do Partido dos Trabalhadores da Coreia, em outubro do ano passado. Em seguida, a promessa de um quarto teste nuclear iminente. A polêmica voltou a adormecer no cenário internacional, até que no mês passado reacendeu com a notícia de que o país poderia estar em posse de uma possível bomba de hidrogênio. E então, chegamos ao dia de hoje.
É sabido que o regime norte-coreano tem como base a retórica e a mitificação. Mas, então, fica a pergunta: até quando o regime norte-coreano vai brincar com as instituições jurídicas internacionais e debochar da comunidade internacional de tal maneira? Outro ponto preocupante a ser destacado no evento noticiado se dá em relação ao apoio popular interno ao regime – cabendo aqui a discussão se de forma voluntária ou coercitiva. Muitas pessoas se reuniram em frente à uma grande tela de vídeo para torcer e assistir ao anúncio feito pela TV estatal norte-coreana de que o país havia realizado um teste nuclear.

Podemos esperar um cenário de novas sanções econômicas da ONU – mais inconvenientes e somadas a tantas outras da dinastia Kim, tendo os parceiros econômicos de Pyongyang que encontrarem novas formas de contornarem a sua aplicação. No tocante ao seu principal parceiro econômico, é notável que, mediante a suspeita de mais um teste nuclear norte-coreano, a China será pressionada a opor-se ativa e eficazmente aos feitos de Pyongyang. Todavia, mesmo demonstrando insatisfação com relação aos testes nucleares, Pequim pode se demonstrar menos interessada do que Washington gostaria que fosse. Entre a retórica e a realidade, Kim Jong-un continua brincando em meio às resoluções do Conselho de Segurança da ONU contra o país, explicitando o fracasso da comunidade internacional em garantir paz e estabilidade na península que ainda vive sob o armistício de 1953, a insuficiência de vontade internacional em desmantelar o programa nuclear norte-coreano e esclarecendo que ter uma Coreia do Norte “insana” e nuclear é manter ativa a disputa pela hegemonia de poder da região.
NOTA DO KOREAPOST: Marcelle Torres (nova colunista e autora do texto) é pós-graduanda em CBA Negócios Internacionais pelo IBMEC/RJ, bacharel em Relações Internacionais e graduanda em História (licenciatura) pelo IUPERJ. Ela é pesquisadora na área de península coreana da Escola de Guerra Naval – Núcleo de Avaliação da Conjuntura, do Rio de Janeiro. Interessada por assuntos militares, políticas nucleares, unificação da península coreana, Direitos Humanos e desenvolvimento da área de negócios nas Coreias (agricultura orgânica e sustentável), iniciou suas pesquisas quando teve o sonho de que deveria escrever sobre a Coreia do Norte.
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Eu adoro as colunas do koreapost, me mantém sempre informada. Obrigada !
Agradecemos o carinho, Amanda!
Muito boa essa matéria. Bem vinda a família KoreaPost.
Obrigada, Philip! É um prazer fazer parte da família KoreaPost.
Seja bem vinda, Marcelle! Muito bom poder ler um relato de alguém que realmente entende do assunto, com imparcialidade!
Muito obrigada, Bruno! Grande abraço!
Seja bem-vinda, Marcelle.
Coluna excelente e esclarecedora de quem entende do assunto.
Muito obrigada, Ju! Grande abraço!